quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Dois do Mensalão

 

Esta história se torna atualíssima, pois estão envolvidos nela dois personagens que nestes dias não saem dos noticiários políticos e policiais. São publicitários mineiros que eram meus clientes na década de 1980, em Belo Horizonte, e jamais imaginariam, na época, em que iriam se meter na história da publicidade e da propaganda.

Estamos falando de 1986 ou 1985, eu, contato na Globo Minas. Era o começo do desmoronamento da guerra fria, e isso é importante, pois falaremos dos Jogos da Amizade que aconteceram na Rússia, em Moscou, e em Los Angeles, nos EUA.

Os Jogos da Amizade faziam parte da aproximação dos dois países poderosos, que acertaram fazer uma Olimpíada particular para comemorar o sucesso de suas negociações políticas.

A Rede Globo comprou o evento e nós tínhamos que vendê-lo, e foi o que eu armei com o único cliente em condições de comprar algo valendo na época um milhão de dólares, a Tecelagens Santa Rosa.

A agência era a SMP&B, na época, donos, o Cristiano Paz e o Mauricio (que alguns anos depois sofreu um acidente de moto numa trilha e foi decapitado por um arame farpado ). O Ramon Hollerbach  era na época o diretor de atendimento da agência do Cristiano e do Maurício.

A SMP&B naquele ano ia mal das pernas e a salvação era vender os jogos à Santa Rosa  – tarefa difícil de enfrentar naquele momento.  O diretor de mkt, o Vicrota, genro do fundador da empresa, acabara de se separar da filha dele e a confusão estava até nos jornais de BH e Rio, com histórias de sequestro da neta e uma lavagem de roupa enorme para os costumes de uma família do interior do estado do Rio, na cidadezinha de Valença.

O fundador da Santa Rosa nos receberia, mas teríamos que levar o diretor de mercado da Globo Minas, o Sinval de Itacarambi Leão, que, justamente no dia marcado, tinha sido convidado para um almoço com o então governador de Minas, Tancredo Neves – ao qual, em hipótese alguma, faltaria. Estávamos na iminência de ele ser o futuro presidente do Brasil, e o Sinval, como bom partidário das esquerdas, me disse que eu arrumasse outro dia. Tentamos, mas o cliente estava cheio de compromissos e aquele dia era perfeito, pois no dia anterior haveria um leilão de cavalos na fazenda onde o Sr. Santa Rosa iria nos receber.

Numa sacada rápida, convenci o Cristiano Paz e o Maurício a alugar um avião, sairíamos de manhã cedinho e entregaríamos o Sinval no palácio para o almoço, às 12h30min. Eles relutaram, pois estavam sem grana, mas eu os convenci de que não seria o aluguel de um Comander (nome do avião alugado da Líder Táxi Aéreo) que iria fazer diferença para quem estava com falta de grana. Se fechássemos o negócio, os 20% e o BV salvariam a SMP&B.

Quem pode imaginar a agência do mensalão sem grana, em 1985.  Quem sabe, se esse negócio não saísse, eles estariam fora desse imbróglio político em que hoje estão?

Bem, às seis horas da manhã subimos no avião, o Sinval, o Cristiano, o Ramom, o atendimento, o Rodrigo Simões, e eu. Viagem agradável; descemos no aeroporto de terra de um quartel do Exército em Valença, e lá já nos esperava um carro da Santa Rosa.

Desculpe, não me lembro do nome do dono da cidade (rsrsrs...) , que, naquele dia, estava feliz da vida, havia comprado um cavalo por quinhentos mil dólares, que era seu sonho de consumo.

Logo que chegamos, lembro-me daquela casa linda e cheia de quadros de cavalos. Não vimos a compra, mas em sua sala já estava a escultura do garanhão comprado no dia anterior que o ex-dono deu de presente ao comprador.

Conversamos bastante e em um determinado momento o Sinval fala do almoço com o Tancredo naquele mesmo dia e da oportunidade de a Santa Rosa comprar o patrocínio de um evento internacional. Disse que a Globo estava levando duzentos profissionais e que a cobertura seria um sucesso.

O Sr. Santa Rosa fala de seus problemas sem o mkt e os rolos que isso estava causando em sua família e em sua empresa. O Sinval compara os valores do patrocínio com a compra do cavalo na noite anterior.

Em um determinado momento, o Sinval fala que até alugou um avião para ver seu amigo empresário, coisa que era mentira – quem havia alugado era a SMP&B.

Tínhamos uma hora “x” para sair dali, para o avião chegar antes do almoço com o Tancredo. As coisas não foram fáceis. Não saímos de lá com o patrocínio fechado, ainda sofreríamos dias para aquilo acontecer.

Foi difícil para os pilotos decolar o avião daquele aeroporto de terra. Arremetemos umas duas vezes antes de subir.

Na semana posterior, o Cristiano ligava diariamente para o Sinval. E eu era convocado o dia todo na SMP&B, na sala do Cristiano.

Foram tantas as ligações para Valença que seis dias depois fechamos o patrocínio do evento. No nacional, só a Santa Rosa (BH) e a Bacardi (RJ).

O evento para o qual falamos que mandaríamos duzentos profissionais na maioria das transmissões deixava vazar o off em inglês; os esportes coletivos do Brasil, vôlei, futebol, basquete, trouxeram quase nada de medalhas. Um fiasco!

Para o cliente, foi mais ou menos. As audiências foram boas para a agência e a Globo – uma salvou sua pele e nós batemos a meta.

Como já disse acima, imagine se esse negócio não sai e a SMP&B quebra! Não haveria mensalão e Marcos Valério, que, naquela época, devia ser vendedor de imóveis ou coisa assim, nem existiria hoje.

Em 1986, voltei para São Paulo. Nunca mais vi a Santa Rosa no ar, mas o Cristiano e o Ramon são personagens da história mais negativa da publicidade brasileira. Estão no Jornal Nacional todos os dias.  O Marcos Valério foi publicitário só no mensalão; antes, ninguém havia conhecido o tal careca.  




segunda-feira, 27 de agosto de 2012

150 por hora


Morei quatro anos em Belo Horizonte na época em que a Fernão Dias era um lixo. Quando vinha a São Paulo de carro com a família, não dormia direito uns três dias antes – a estrada me dava medo. Sei exatamente quantas vezes a peguei: dezessete idas e dezessete voltas.
Esta história tem a ver com velocidade, compromisso e negligência ao volante e se passou entre 1982 e 1986 na volta de um Carnaval que vim passar com a família em São Paulo.
Trabalhava na Globo Minas  – anos bons,  dos enduros da Liberdade e Independência, patrocinados pelo brim Santa Rosa, desenvolvidos pela equipe de mkt da emissora e seus diretores (já falamos disso em outra história). Nosso gerente de vendas era o Talardo José dos Santos. Pegava forte com a equipe e uma das coisas que o irritavam era a volta do Carnaval. O RH mandava estarmos às 12h da Quarta de Cinzas na emissora, e o Talardo lembrava isso uma semana antes do feriado.
Nós, bons contatos, em diversas oportunidades chegamos às 14h e ele ficava muito bravo. A equipe era ótima: Carlos Doné (hoje, na Rádio Itatiaia), Jorge Calabria, Dejair de Almeida Toscano e o Mario Neves (hoje, SBT Minas). Desafiar o Talardo era para macho e quem esteve lá sabe que mesmo com o bom salário que tínhamos éramos fortes e de opinião, na maioria dos carnavais chegamos às 14h.
Quando chegamos às 12h, ele fez reunião até às 14h e queria que visitássemos as agências que emendavam a Quarta. Foi um desastre os quatro carnavais que passei quando trabalhava em  BH.
Como falei acima, tinha medo da estrada e para chegar de São Paulo em BH na quarta-feira saía às 4 da manhã e corria que nem um louco naquela estrada capenga e sem a menor condição de viagem – imagine a 150 km/h.
Num desses carnavais fiz o recorde na Fernão Dias – seis horas – e fui personagem logo à tarde em uma agência que, descobri, não emendaria o feriado. Era a Staff, do José Maria Vargas, hoje um dos diretores da ANP, onde eu tinha as portas abertas. Naquela quarta de cinzas só o Zé trabalhava.
Quando estava lá, chegou o contato da Rádio Globo, o Carlos Henrique Nascimento – que o mercado conhece, trabalha na TV Globo SP, transferido  a muitos anos de  Minas – e me perguntou se eu estava na estrada pela manhã.
Eu disse que sim e ele meio sem jeito me falou: “Hélcio, trabalhamos no mesmo prédio e você tem dois filhos, não era melhor não correr tanto na estrada? Estava com meus pais e vi você ultrapassar uma ‘cegonha’ (caminhão que transporta carros) e mais quinze a vinte veículos atrás dela em uma subida, a uns 150 por hora”.
Eu, sem jeito pela travessura sem sentido, tentei minimizar o que não dava para minimizar (tipo batom na cueca), e falei que a culpa era do Talardo, como todos no mercado o conheciam, e passei batido com o jovem Carlos Henrique na época.
Os meninos do sistema Globo de radio BH, fizeram história em São Paulo o Carlos Murilo Moreno ( ex Fiat  hoje Nissam )também veio de lá.
Até hoje, quando estou em estrada, lembro-me desse momento, de uns anos para cá não pego estrada longa, pois corro muito, fico ansioso e sem responsabilidade.
O meu gerente na época não tinha culpa de nada. Eu é que sempre corri nas estradas.
Hoje não pego estrada de mais de duzentos quilômetros, mas, mesmo assim, ainda corro mais que o normal.
Mas sempre lembro que posso passar a vergonha que passei na Staff, a única agência aberta na quarta de cinzas e cheia de contatos de outros veículos na recepção excepcionalmente naquele dia.